As chuvas não são culpadas
A vulnerabilidade da cidade
Vinicius Ribeiro Artigos 2104 views 3 min. de leitura
Começa a chover no final do dia e interrompo minha caminhada para cortar o cabelo. Ao entrar em um estabelecimento, vejo clientes muitos preocupado conversando entre eles. Ao perguntar por que estavam daquele jeito, me respondem que “as chuvas param a cidade”. Depois de algumas falas extras acabam resumindo que “é normal” isso acontecer. “Todos já estão acostumados”. O proprietário entra na conversa e me mostra a base da bancada úmida pelos centímetros de água que invadiu seu local de trabalho.
Eu também fui vítima. A audiência pública de realização do Plano de Mobilidade que estamos trabalhando programa para ser realizada hoje foi cancelada. Investi tempo, dinheiro e trabalho para sua não efetivação. Como o meu exemplo, são inúmeros retrabalhos que acontecem em um episódio como esse.
Confesso que a chuva não pode parar negócios e relacionamentos. Nos acostumamos com isso, tornando nossos pensamentos acomodados e reativos. A cidade não pode ser assim. Ela não merece, e nem seus cidadãos.
Ao longo de muito tempo autorizamos construir e ocupar áreas naturais de fluxos hídricos. Foi um erro histórico, associado a outro atualmente: acharmos que isso é normal.
A solução começa em perceber que a cidade não deve ser assim, e que as pessoas não podem se acostumar mais com isso. Estagnar a ocupação de áreas vulneráveis é uma prioridade como qualquer outra em uma cidade. Associado a isso, é necessário eliminar a impermeabilização da nossa cidade. Aumentar porosidade do solo colabora com a filtração além de ajudar no conforto ambiental. Em medidas mais drásticas, áreas de absorção e retenção de água são soluções que a engenharia sugere.
A resiliência pública e comunitária pode ser analisada nessa hora também. As cidades não estão preparadas para esses “efeitos externos”. A reação das cidades é cancelar serviços, encontros e protelar ações. Gerenciar ações deste nível exige novas abordagens do poder público, ao reconhecer o problema e planejar ações e projetos claros no território local. Redes informais crescem nas cidades e podem ajudar na propagação da informação e no engajamento das pessoas nesta causa.
Por fim, há muito o que fazer. Admitir que as chuvas não são culpadas, e sim o nosso conformismo em viver com isso, poderá ser o mais simples e importante passo para a solução desse problema.